O termo já
ganhou fama, Terapia Gênica. E com razão. É uma ferramenta poderosa e
promissora em diversas áreas da ciência.
Terapia Gênica se refere à terapia onde se
utiliza um determinado gene para curar uma doença ou induzir uma determinada resposta
(como numa vacina). Por exemplo, a fibrose cística é uma doença de fundo
genético, ou seja, a origem da doença está no gene que dá origem a um
transportador iônico chamado CFTR (Cystic
Fibrosis Transmembrane conductance Regulator, ou Regulador de Condutância
Transmembranar da Fibrose Cística). Nos pacientes, esse gene é defeituoso, e dá
origem a um transportador defeituoso. Havendo um gene “correto” da CFTR, esse
problema seria resolvido, e o paciente seria curado.
Identificar
o gene importante para curar determinada doença/vacina é a parte mais fácil (e
às vezes nem é tão fácil assim). Colocar o gene de interesse dentro da célula
do paciente e conseguir a sua expressão a contento é que é complicado.
Primeiro
temos que resolver a questão: Como colocar um DNA dentro de uma célula? No
laboratório, numa cultura de células, isso é fácil, trivial até, mas em seres
vivos complexos nem tanto. Existem algumas alternativas: usar o DNA sozinho (ou
nu, como se costuma chamar), complexar ele com moléculas que tenham a
capacidade de se fundir com as membranas nas células, ou colocar ele dentro de
um vírus. Isso mesmo, os vírus são mestres em transferir seu material genético
para células hospedeiras, o que faz deles as melhores ferramentas para isso.
Os vírus usados
em terapia gênica são modificados, se tornando não infecciosos (não se replicam
dentro da célula) e não patogênicos (não causam doença), eles apenas conseguem transferir
o gene de interesse para a célula. Esses vírus são chamados de vetores, um nome
muito apropriado, já que vector em
latim significa “aquele que entrega”. Uma vez dentro
da célula alvo o DNA é expresso, dando origem à(s) proteína(s) de interesse.
Mas geralmente não por muito tempo. Acontece que as nossas células estão
programadas para combater materiais genéticos estranhos (afinal, elas
aprenderam ao longo de muitos milênios de infecção a se precaver contra vírus),
e esse material dura muito pouco dentro da célula, antes de ser degradado pelo
seu sistema de defesa. Além disso, o vírus não se replica dentro da célula (nem
o gene dentro do vírus).
Uma
alternativa para solucionar esse problema é usar como vetores vírus que além de
entregar esse gene de interesse para às células-alvo integrem esse gene no DNA
da própria célula, sendo assim, o DNA da terapia vai se comportar como se fosse
o DNA da célula, sendo inclusive duplicado toda vez que o DNA da célula for
duplicado. No entanto, isso pode gerar vários problemas. Imagine se esse DNA
acaba parando dentro de um gene importante? Esse gene importante não vai mais
funcionar como deveria (ele será “truncado”). Esse gene pode se integrar dentro
de um gene repressor de tumores, por exemplo, e sem a repressão, isso pode levar
ao desenvolvimento de câncer. Esse deve ser um problema a ser solucionado (e
está sendo) antes de considerarmos o uso desses vetores em terapias gênicas.
Embora
ainda precoce, a terapia gênica têm muito potencial. Ela pode ser utilizada para
curar doenças de fundo genético, seja ela causada pela não-expressão de um
gene, sua expressão descontrolada, ou por um gene que gere uma proteína
defeituosa/anormal. Pode também ser usada para curar doenças infecciosas, como a
AIDS. A terapia gênica pode ainda ser utilizada para produção de uma nova
classe de vacinas, ou até mesmo para terapias que substituam vacinas. É claro que a teoria é sempre linda, mas a realidade de fato sempre têm mais nuances e facetas. Por isso, todos os estudos utilizando terapia gênica ainda são preliminares, e poucos foram realizados em humanos. Todas as consequências de se inserir um DNA estranho (e vírus) num organismos estão sendo estudadas, a fim de que se possa restringir ao máximo qualquer efeito danoso desse procedimento.
Mas com o tempo, a tendência é que as limitações sejam contornadas e mais e mais estudos entrem em fase clínica (com experimentos em humanos), acumulando conhecimento. E uma vez que essa técnica seja totalmente dominada, uma mudança de paradigma pode ser esperada. A terapia gênica promete revolucionar a medicina, como fizeram os antibióticos, a anestesia e as vacinas antes dela.
Por Luiza Montenegro Mendonça.
Ilustração retirada daqui.